Catamarã e celulose mudam a face de Guaíba

Berço da Revolução Farroupilha, município recebe investimentos e aumenta a arrecadação com atividade turística

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Jornal do Comércio 09/09/13
Adriana Lampert

Depois de um período de estagnação, os ventos sopram a favor de Guaíba. Parte do novo momento que vive a cidade pode ser creditado ao incremento do turismo e, outra, aos investimentos pesados que prometem turbinar a economia local. A chegada do catamarã alterou a rotina da outra margem do rio. O moderno meio de transporte, ligando o município à Capital, já responde pelo desembarque de cerca de 5 mil visitantes por final de semana na cidade-berço da Revolução Farroupilha. Além do fluxo de turistas que movimenta o comércio local, tambéma industrialização chega com força. Para os próximos dois anos, estão previstas obras na ampliação da produção da Celulose Riograndense no montante de R$ 5 bilhões, a chegada da montadora Foton (R$ 250 milhões), da fabricante de equipamentos Impsa (R$ 100 milhões) e da indústria de torres Engebasa (R$ 150 milhões). Na área de serviço e turismo, a rede Ibis anuncia investimento de R$ 7 milhões na construção de um hotel. Em um ritmo mais lento, mas nem por isso menos importante, a economia local melhora a oferta no setor gastronômico para fidelizar o turista.   

O chefe do Executivo de Guaíba, Henrique Tavares, já é chamado de “prefeito rico” entre os colegas da Grampal (Associação dos Municípios da Região Metropolitana de Porto Alegre). Mas Tavares pondera que o desenvolvimento está “em andamento”. “O resultado forte virá em 2017”, calcula, referindo-se ao período em que as indústrias estarão funcionando a pleno. Também terão sido concluídos os atuais investimentos em obras viárias e na orla do Guaíba, um dos atrativos principais para o público que utiliza o catamarã para chegar à cidade. 

“As pessoas gostam muito de passear pela orla, apreciar as belezas naturais”, comenta a secretária de Turismo e Cultura de Guaíba, Cláudia Mara Borges. “Estamos trabalhando na qualificação da área gastronômica do entorno. Muitas empresas que não abriam aos domingos, em função do turismo e do movimento, começaram a abrir”, completa. Desde outubro de 2011, quando a empresa Catsul investiu em duas embarcações com capacidade para 120 lugares, que ligam diariamente Porto Alegre a Guaíba, muita coisa já mudou em termos de infraestrutura do município, destaca o prefeito. “Já foram investidos cerca de R$ 3 milhões em melhorias para incentivar o turismo na região”, calcula. As principais iniciativas foram o tratamento de esgoto, a reforma (ainda em andamento) da praça principal (Gastão Leão), a pavimentação do calçadão na beira do Guaíba e a realocação de 37 camelôs que trabalhavam na orla para um centro popular de compras, erguido com verba municipal do outro lado da rua.

Os agora microempresários têm CNPJ e atendem à clientela em bancas de  4 m x 3 m. A satisfação foi geral, garante o proprietário de banca de brinquedos e eletrônicos Edson Luis Silveira de Oliveira. “Melhoraram as condições de trabalho e ainda aumentaram as vendas, já que muitos visitantes novos da cidade também consomem por aqui”, comenta. “Estamos vendo Guaíba crescer, e isso é bom para toda a população.” Também a área gastronômica se qualificou, em vista de que a demanda cresceu em 80% nos finais de semana. 

Em dois anos, cinco novos restaurantes abriram as portas. Proprietário de um dos pontos de alimentação localizados na orla, o empresário Carlos Ricardo Santana afirma que o fluxo de pessoas na região aumentou muito, graças ao funcionamento do catamarã. “Estou abrindo outro negócio, de comida chinesa, pois já não damos conta de atender a todo o público nos sábados e domingos”, declara Santana. 

Segundo o empresário, somente no final de semana passam 800 clientes pelo restaurante, que serve buffet executivo ao meio-dia e oferece pizzas e comida a la carte durante a noite. “Ficamos surpresos, não esperávamos um fluxo tão grande de pessoas. Tive que aumentar em 20% o número de funcionários e em 10% o número de mesas”, enumera. O faturamento da empresa também inflou: “Cresceu 30%”, resume o proprietário.

 

História atrai público de todas as idades

Nem só de finais de semana vive o turismo de Guaíba, que atualmente recebe em torno de 20 mil visitantes por mês. Antes do catamarã, a cidade já trabalhava com o segmento de turismo histórico, em função de ser conhecida como o berço da Revolução Farroupilha. Foi lá que líderes farroupilhas, entre eles Gomes Jardim, reuniram-se para as últimas tratativas antes de 60 homens tomarem Porto Alegre na noite do dia 19 para 20 de setembro de 1835. Segundo a titular da Secretaria de Turismo e Cultura do município, Cláudia Mara Borges, a cidade já aproveitava esse nicho.

“Antigamente, recebíamos 6 mil visitantes durante a Semana Farroupilha”, compara Cláudia, admitindo que hoje esse volume é semelhante ao número de desembarques que ocorrem somente durante um final de semana do ano. Mas a gestora ressalta que, além do rio, há outros pontos turísticos que podem ser explorados, e que, nos dias de semana, atraem a visitação de grupos fechados de pessoas da terceira idade, ou escolares. “Graças a isso, em torno de 100 a 200 visitantes fazem passeios nos pontos de turismo histórico no decorrer da semana”, ressalta Cláudia.

Esses grupos fazem a rota proposta pelo centro de atenção ao turista implementado na hidroviária, percorrido também pela linha de ônibus que faz o city tour da cidade. O veículo, intitulado Jardineira, remonta o caminho dos tropeiros, passando pelo sítio histórico de Guaíba, que engloba a Igreja Matriz, a casa onde a Princesa Isabel ficou hospedada, a antiga residência de Gomes Jardim (militar e presidente da República Riograndense durante a Guerra dos Farrapos), um mirante para o rio, o espaço Vitrine Cultural, a orla e o píer. 

Cláudia destaca que, no espaço Vitrine Cultural, onde há um memorial da Revolução Farroupilha, um livro registra e embasa os cálculos de visitantes. Desde que foi inaugurado, há seis meses, 96 mil pessoas estivaram no local. “Nesse período, a cidade foi visitada por 1,5 mil estrangeiros, 58 mil gaúchos, 8 mil visitantes de outros estados e 28 mil de municípios vizinhos”, enumera. 

 

Chegada de indústrias eleva oferta de emprego e impulsiona economia 

Banhada pelas águas do lago, Guaíba já caiu na graça de milhares de turistas, que chegam da Capital todos os dias, via catamarã. Agora, com os recentes anúncios de instalação de novas indústrias, a população eleva sua autoestima e também as expectativas de desenvolvimento, com promessas de geração de emprego e renda. Segundo o prefeito, Henrique Tavares, serão mais de R$ 5,7 bilhões. Com este aporte de recursos, a estimativa é de que o orçamento do município dobre, passando de R$ 150 milhões para R$ 300 milhões em 2017. Quando estiverem funcionando a pleno, estas indústrias levarão Guaíba a dar um salto do posto de 17º para 8º lugar no PIB estadual. 

Na lista de investimentos de porte, constam a Celulose Riograndense, Foton, Impsa e Engebasa. Estas fabricantes chegam ao município para trabalhar ao lado de outras marcas, como Toyota, LGTec, Celupa (Melitta) e Sulina, entre outras de pequeno e médio portes, fabricantes de equipamentos para grandes indústrias. De acordo com o secretário de Desenvolvimento Econômico de Guaíba, Cleber Quadros, o setor industrial já representa 65% da arrecadação do município. A cidade ainda conta com 5.029 lojas de comércio e 5.111 empresas de serviços. Com população estimada em 98 mil pessoas, a cidade projeta o futuro com o apoio de um Plano Estratégico de Infraestrutura Urbana realizado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs). “Eles mostraram para a gente o potencial da região, uma vez que estamos de frente para duas BRs, agora sendo duplicadas”, frisa o prefeito, Henrique Tavares. 

O gestor comenta que o bom momento está vinculado à superação de barreiras ao desenvolvimento industrial, como um posto de ICMS antes localizado na entrada da cidade, “que provocava um gargalo imenso no trânsito”, ou questões relacionadas à falta de pedágio (já previsto para ser implementado). “Algumas coisas estão melhorando. Temos ainda um projeto em andamento em parceria com o governo do Estado, com o objetivo de duplicar a Estrada do Conde”. 

Além disso, uma Parceria Público-Privada com a Celulose Riograndense garantiu injeção de R$ 40 milhões em obras viárias dentro do município. “Os recursos foram destinados pela fabricante, mas serão descontados dos impostos do que a CMPC começar a produzir a partir de 2017, após a ampliação da planta, prevista para ficar pronta em 2015”, explica Tavares. O prefeito frisa que o projeto que aumenta a área de atuação da fábrica de celulose dos atuais 4 hectares para 10 hectares no município está “mexendo com a economia local”. “A cidade tem sido muito procurada. Todo dia tem uma empresa grande buscando informações para se instalar em Guaíba”, valoriza Quadros, completando que a demanda é tamanha que a secretaria está “filtrando” os interessados.  

De acordo com a vice-presidente da Associação Comercial e Industrial de Guaíba (Acigua), Cleni Ovalhe, somente a ampliação da planta da Celulose Riograndense irá gerar até 10 mil empregos. O prefeito pontua que a ideia é utilizar a mão de obra local. “Fizemos uma parceria com o governo do Estado, e estamos oferecendo via cursos do Pronatec a capacitação de profissionais do município e região do entorno, a fim de minimizar a migração de pessoas.”

Mesmo assim, não há como evitar que também a população da cidade cresça, observa a dirigente da Acigua. “Deve dobrar para 200 mil pessoas em breve espaço de tempo”, calcula. Há quem já esteja antenado e investindo neste sentido. Em novembro, inicia a obra de um hotel Ibis com 120 quartos, resultado de um investimento em torno de R$ 7 milhões.  

 

Catsul vai aumentar linhas do catamarã

O diretor de operações da empresa que opera os catamarãs (Catsul), Carlos Bernaud, diz que o sucesso do meio de transporte foi tamanho que em breve é possível que um terceiro veículo passe a compor a frota. “Tudo depende da demanda aumentar, em vista das instalações da Celulose Riograndense e outras indústrias que estão chegando em Guaíba”, pondera. Mas já existe projeto. Neste caso, o catamarã terá 140 lugares e o investimento ficará em torno de R$ 4 milhões, prevê o empresário. 

Além de turistas, o catamarã transporta 2,5 mil pessoas por dia durante a semana, que saem pela manhã e retornam à tarde. O preço da passagem é acessível e faz jus ao passeio tranquilo, com vista privilegiada. Atualmente, cada viagem custa R$ 7,25. Segundo Bernaud, a embarcação faz 37 horários de segunda a sexta-feira, e 28 horários aos finais de semana. “Se o tempo está bom, colocamos uma viagem extra, e o número pula para 40”, ressalta. Bernaud ainda anuncia que, em breve, o catamarã começará a operar com saídas também em frente ao BarraShopping Sul, em Porto Alegre. “De lá, poderemos levar o pessoal da zona Sul que queira se deslocar tanto para o Centro da Capital quanto para Guaíba. Os dois trechos serão feitos em 12 minutos.”

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